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Notícias

12 de novembro de 2018

Sob efeito Trump, cresce dependência brasileira da China

A disputa comercial liderada pelo americano Donald Trump contra a China já é sentida pelo Brasil, que nunca foi tão dependente das exportações para o país asiático como neste ano.Os chineses, que de janeiro a outubro de 2017 já respondiam pela compra de 22,5% dos embarques brasileiros, ampliaram a fatia para 26,8% nos dez primeiros meses deste ano.
Como resultado do conflito comercial com os EUA, a China comprou mais produtos básicos brasileiros (grãos, carnes e minério, por exemplo). Quase metade deles (47,7%, ou US$ 47,3 bilhões) foi para o país asiático no acumulado até outubro, um avanço de 6,1 pontos percentuais em relação a igual período do ano passado. O desempenho fez os chineses aumentarem sua vantagem como maior parceiro comercial do Brasil. Os EUA, segundo lugar nas exportações, têm menos da metade: 12%.
Desde 2001, as exportações de commodities não estavam tão concentradas em um único destino. Naquele ano, a União Europeia respondeu por 50,6% das vendas brasileiras de commodities, que somaram US$ 13,2 bilhões no período, mas em uma pauta muito menor. As commodities já representam US$ 99,2 bilhões das vendas de janeiro a outubro deste ano.
As exportações totais para os chineses aumentaram em 28,8% neste ano (para US$ 53,2 bilhões), ritmo muito maior que os 8,5% no total das exportações - sem os chineses, a alta foi de 2,6%. A maior dependência vem num momento de tensão nas relações sino-brasileiras em razão das declarações do presidente eleito, Jair Bolsonaro, que durante a campanha demonstrou que vê com restrições os investimentos chineses.
Na sequência da vitória de Bolsonaro, o jornal estatal "China Daily" afirmou que o "Trump tropical" - como chamou Bolsonaro - arrisca gerar um custo pesado para a economia brasileira caso decida romper com Pequim.
Welber Barral, sócio do escritório Barral M Jorge e ex-secretário de Comércio Exterior, diz que, na magnitude em que se deu, o crescimento das exportações brasileiras à China é resultado não somente do aumento da demanda do país asiático e da elevação de preços de algumas commodities, como também da retaliação chinesa aos EUA. "É em parte um desvio de comércio, e não criação de comércio. Por isso o efeito não deve ser perene."
A participação das iniciativas de Trump é inegável em dois dos três principais produtos vendidos para a China: soja e petróleo. Com a disputa comercial aberta pelo republicano contra os chineses, as vendas da oleaginosa subiram 27% em valor, para US$ 24 bilhões (em volume a alta foi próxima, de 20,4%).
O principal produto de exportação brasileiro se beneficiou da briga aberta pelo mandatário americano, de quem Bolsonaro tem buscado aproximação. Segundo o governo dos EUA, o Brasil responde por 66% das importações chinesas de soja, ante 48% na safra passada. Este avanço se deveu em grande parte aos EUA, que viram sua fatia cair em dez pontos percentuais, para 29%.
No caso do petróleo, a participação de Trump foi indireta. O preço do barril, que no mês passado atingiu sua máxima em quatro anos, foi alimentado pelas ações do republicano, especialmente a decisão de retirar os EUA do pacto nuclear com o Irã e a retomada das sanções contra o país do Oriente Médio.
Com isso, as vendas de petróleo para os chineses cresceram 84% em valor e 57% em volume. Elas somaram US$ 11,5 bilhões até outubro e superaram com folga as de minério de ferro (US$ 8,6 bilhões). É a primeira vez em mais de 20 anos (contando o período de janeiro a outubro) que o Brasil vende mais petróleo para a China do que minério de ferro.
Esse aumento reflete em parte uma série de acordos que a Petrobras tem feito nos últimos anos com empresas chinesas em troca de financiamento. Já em 2017, o Brasil foi o sétimo maior fornecedor de petróleo para os chineses, superando a Venezuela e ficando só atrás de tradicionais produtores como Rússia, Arábia Saudita e Irã.
Para Anna Jaguaribe, presidente do Instituto de Estudos Brasil-China e membro do conselho curador do Centro Brasileiro de Estudos Internacionais (Cebri), a dependência de um único país não é necessariamente negativa e lembra o caso da Austrália, que em 2017 vendeu 30% dos seus produtos para a China. Ela ressalta, porém, que cabe ao Brasil diversificar a disponibilidade de itens de exportação.
Já Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), diz que eventual perda de exportações em razão de restrições à atuação da China agravaria a trajetória de deterioração das exportações como um todo. Ele destaca que o resultado da balança comercial está confortável, mas o desempenho das exportações, principalmente de manufaturados, tornou a exportação brasileira mais dependente dos produtos básicos.
As exportações de manufaturados, destaca Cagnin, mantêm crescimento, mas a ritmo menor. O embarque desses bens subiu 5,7% de janeiro a outubro deste ano ante os mesmos meses de 2017, considerando a média por dia útil. Em igual período do ano passado, na mesma comparação, a alta foi de 12%. Os semimanufaturados, que também são bens industrializados, diz ele, têm desempenho ainda pior, com queda de 2,9% de janeiro a outubro deste ano.
Os básicos também não estão no melhor dos mundos, avalia Cagnin. Embora com alta, os embarques de básicos também passam por desaceleração. O crescimento de exportação dessa classe de produtos caiu de 28% em 2017 para 13% este ano, considerando o acumulado até outubro.
Para Barral, eventual restrição do Brasil a investimentos chineses em áreas que poderiam ser consideradas estratégicas não teria grande efeito para as exportações. Isso porque a demanda da China é muito alta. Para a soja, exemplifica ele, há além do Brasil, apenas dois grandes fornecedores, que são Argentina e EUA, com o qual já protagoniza um conflito comercial.
Jaguaribe, do Cebri, considera que as críticas de Bolsonaro à China se devem em parte a rumores de campanha e que, uma vez no poder, as decisões serão mais pragmáticas, e não ligadas a "fantasmas do passado". Os chineses, segundo ela, são mais parte da solução que um problema.
A China, diz Barral, será importante no superávit comercial brasileiro neste ano. De janeiro a outubro, o saldo positivo com os chineses somou US$ 25 bilhões, mais da metade do superávit de US$ 47,7 bilhões do total da balança comercial brasileira nesse período.